07/11/2012

Sobre o mês que cá fizemos...

"Quinta-feira fazemos um mês!"

“Quinta-feira fazemos um mês!” Como data simbólica a recordar, vamos ter de festejar.

Quinta-feira fez um mês que chegámos à Guiné-Bissau e fez também um mês que estamos a deixar que a Guiné chegue a nós. Sim, porque isto de chegar, não é só uma coisa física e já está! É preciso tempo e que nós e a Guiné nos deixemos ir conhecendo e querendo ir chegando uma à outra. A Guiné não sabe o que trago para ela e eu não sei o que a Guiné tem para mim. Por isso aqui, ainda somos, eu e a Guiné, bebés uma para a outra. Posso-vos dizer para já que temos sido umas bebés de olhos bem abertos, atentas a todos os estímulos; pacientes para com os contratempos e que se sentem a começar a gatinhar no espaço que uma e outra está a criar no coração para se receberem mutuamente.
E olhem que o coração da Guiné parece ter espaço para muita gente!
Eu e a Guiné, nesta relação de infância que nos está a unir, ainda nos estamos a aprender a: Observar, não com os olhos que eu trazia mas com os que existem cá;
Andar, não com a referência de estradas e transportes que eu trazia, mas com as que existem cá;
Iluminar, não com os hábitos de utilização de energia que eu tinha, mas com recursos disponíveis cá;
Alimentar, não com as regras que eu conhecia mas com a naturalidade com que o fazem cá;
Saber melhor as cores, percebendo que o branco pelelé desperta sorrisos, interesse, movimento, espanto. E a mim… confesso, às vezes, constrangimento;
Ter saúde, não com as facilidades que eu conhecia, mas com as condições que por aqui até já há;
É a nascer que me sinto na Guiné. E este (re)nascimento por ser a aparição num outro mundo, que por mais que mo contassem se mostra tão único e original, não está a ser maravilhoso e lindo. Seria demasiado generalista se assim o descrevesse. Contudo, há momentos nesta curta vida deste imenso mundo que são maravilhosos e únicos e só se uma amnésia profunda vier é que deixarão de fazer parte das memórias que me constroem.
Poderia ser mais fácil esta relação de infância que eu e a Guiné estamos a ter? Podia, claro. E até vos sei dizer como.
Teria sido mais fácil nascer aqui por exemplo se não tivesse havido turbulência à chegada, se as malas para o parto e primeiros dias de vida na Guiné não tivessem chegado uma semana depois de mim; se eu não tivesse inicialmente tanto constrangimento a matar baratas; se tivesse mais à vontade para me movimentar no escuro da noite; se os buracos não tivessem tão pouca estrada; se os sítios onde se come (restaurantes) tivessem à partida garantias de higiene alimentar; se houvesse em todo o lado sistema de recolha de lixo; se aquela dor nas costas que seria de tamanho S em Portugal não se transformasse em XXL pela mudança de continente;
Estaria a ter uma melhor relação com a Guiné se o nascimento aqui tivesse sido com menos dificuldades? Não. De modo nenhum. É que a beleza que transborda das pessoas que a Guiné já tem dentro dela e que contagia em pontos que se ligam e fortificam os laços que entre mim e a Guiné se estão a criar, é indiscritível de tão calorosa e envolvente.
A Guiné está-se a apresentar a mim como um país que acolhe quem lhe chegue de mala cheia de flexibilidade, vontade, saúde, boa-disposição e capacidade de aceitação.
Parece-me que nos pede também, a Guiné, que não nos esqueçamos do motivo que nos levou a vir cá nascer.
E com estes sentires, me apetece num longo sussurro gritar por dentro a toda a equipa: “Boa sorte neste início de projecto “Skola i di nos”!


e... o mês da Carmen, aqui!


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