12/12/2012

12.12.12


Com o quase fim do ano, chega o fim deste blog.
Não é por não ter mais o que escrever; o que aqui partilhar.
Não é por não querer manter o olhar de um estrangeiro para toda a vida.
Não é por querer deixar de partilhar aquilo que gosto de sentir por muitos sonhado!
Não é porque já tenha uma casa definitiva… embora sejam tantas as que sinto em mim, para sempre. Há “para sempres” que existem!
Chega ao fim porque SIM. Porque no fundo, todos gostamos (eu gosto) de coisas com limites: um livro, um filme… neste caso, um blog.
Na Outra Casa teve o seu início há 4 anos, em 2008, no sótão da minha casa. Foste tu, um amigo, que despertaste em mim esta vontade: mostrando-me outros que já havia; alertando em mim a sensibilidade para gostar de uma ilustração, de um pormenor, de uma palavra de uma frase, de um telefonema só para contar como se sobe uma escada, como sabe o Júlio Cortázar fazer muito bem.
Foi neste blog que contei, sem ser preciso falar, muitas vezes a mim e a quem me foi acompanhando, o que ia fazendo o meu coração bater mais rápido.
Foi através desta outra casa que conheci pessoas, pensamentos, trabalhos, histórias nas vidas, arte, vontades e segredos que não se contam mas são o que mais força tem nas acções de quem os detém.

Na Outra Casa não é mais que no outro eu. Que afinal sempre foi o mesmo ou nunca se quer se poderá dizer que será.
Foi  Na Outra Casa que fiz intervalos e ganhei força para retomar rotinas.
Foi  aqui, que aprendi a agradecer a agitação de uma vida tão diferente da que me haviam na infância planeado, mas tão surpreendentemente melhor!
Com este blog fui a Londres, a Burgos, a Salamanca, a Amesterdão, a Nova York e à Finlândia, à Austrália, ao Dubai, à Roménia e vim para a Guiné trabalhar.
Esta casa viu-me a trabalhar, a estudar, a namorar. Esta casa viu-me a passear sozinha e acompanhada. Esta casa viu TUDO.
Neste blog fui a muitos sítios dentro de mim e dos que Amo.
Neste blog questionei a minha fé, procurei a minha espiritualidade.
Este blog só tem 4 anos e sabe tanto! Começou com 23 e acaba com 27. É por isso.
Neste blog fiz um luto, fiz renascer o meu pai que tanto me acompanhou sempre, na vida, de casa em casa.
Foi neste blog que assumi a importância do Amor 
... e ganhei a certeza que os contos de fada existem.

Na outra casa, será sempre uma GRANDE casa que em mim guardarei.
Porque agora já não sou eu que habito nela mas ela em mim.
Na outra casa, como blog, fica, neste ano, por aqui.

2 comentários:

Anónimo disse...

Instruções para subir uma escada

"Toda a gente terá observado que frequentemente o chão se dobra de tal maneira que uma parte fica a fazer um ângulo recto com o plano do solo e a parte seguinte se coloca paralelamente a este plano, para dar lugar a uma nva perpendicular, coisa que se repete em espiral ou em linha quebrada até uma altura bastante variável. Se uma pessoa se agachar, puser a mão esquerda numa das partes verticais e a direita na horizontal correspondente, está momentaneamente na posse de um degrau. Cada um destes degraus, formados como se vê por dois elementos, se situa um pouco mais acima e à frente que o anterior, princípio que fornece um sentido à escada, já que uma qualquer combinação talvez produzisse formas mais belas ou pitorescas, mas se revelaria incapaz de ligar um rés-do-chão a um primeiro andar.
Sobe-se escadas de frente, posto que às recuas ou de lado é particularmente incómodo fazê-lo.A atitude natural consiste em manter-se de pé, braços pendendo sem esforço, cabeça erguida embora de maneira a que os olhos não deixem de ver os degraus imediatamente superiores ao que se pise e respirar lenta, regularmente. Para subir uma escada, começa-se por levantar a parte do corpo situada em baixo à direita, quase sempre coberta de couro ou camurça e que salvo raras excepções cabe exactamente no degrau. Posta a dita parte - a que para abreviar vamos chamar pé - no primeiro degrau, recolhe-se a parte equivalente da esquerda (igualmente chamada pé, mas que não se deve confundir com o pé atrás citado) e levantando-o à altura do pé, continua-se até a colocar no segundo degrau onde se descansará o pé, descansando no primeiro o pé. (Os primeiros degraus são sempre os mais difíceis até adquirir a necessária coordenação. A coincidência dos nomes entre o pé e o pé torna a explicação difícil. Tenha-se especial cuidado em não levantar ao mesmo tempo o pé e o pé)
Chegado ao segundo degrau, basta repetir alternadamente os movimentos até chegar ao cimo da escada.
Dela se sairá com facilidade dando um pequeno golpe de calcanhar que a põe no seu lugar, donde não se mexerá até ao momento da descida."

Deus seja louvado, o conto está acabado.

Anónimo disse...

Preâmbulo às instruções para dar corda ao relógio

Pensa nisto: quando te oferecem um relógio, oferecem-te um pequeno inferno florido, uma prisão de rosas, um calabouço de ar. Não te dão somente o relógio, muitos parabéns, que te dure muitos e bons, é uma óptima marca, suíço com não sei quantos rubis, não te oferecem somente esse pequeno pedreiro que prenderás ao pulso e passearás contigo. Oferecem-te - ignoram-no, é terrível ignorá-lo - um novo bocado frágil e precário de ti mesmo, algo que é teu mas não é o teu corpo, que tens de prender ao teu corpo com uma correia, como um bracito desesperado pendente do pulso. Oferecem-te a necessidade de lhe dar corda todos os dias, a obrigação de dar corda para que continue a ser um relógio; oferecem-te a obsessão de ver as horas certas nas montras das joalharias, o sinal horário na rádio, o serviço telefónico. Oferecem-te o medo de o perder, de ser roubado, de que caia ao chão e se parta. Oferecem-te uma marca, a convicção de que é uma marca superior às outras, oferecem-te a tentação de comparares o teu com os outros relógios. Não te oferecem um relógio, és tu o oferecido, a ti oferecem para o nascimento do relógio.
Júlio Cortazar in "Histórias de Cronópios e de Framas"